quinta-feira, 6 de junho de 2013

Visita de um patriarca no séc XVII

Charles Thomas Maillard de Tournon nasceu em Turim a 21 de Dezembro de 1668; a 5-12-1701 foi nomeado patriarca de Antioquia, sendo sagrado por Clemente XI a 21 desse mês; a 2-7-1702 foi nomeado legado a latere para a Índia e a China; chegou a Macau a 2 de Abril de 1705 e a Pequim a 14 de Dezembro desse ano. A 31 desse mês, foi recebido pelo Imperador, que rejeitou a sua legação. A 28-8-1706, deixou Pequim; demorou-se em Nanquim de 17-12-1706 a 17-3-1707. Foi nessa cidade que a 25-1-1707 publicou o fatal Decreto contra os Ritos Chineses, que tão mal fez à Igreja na China durante mais de dois séculos. Exilado para Macau, dirigiu-se a Cantão, aonde chegou a 24-5-1707 e a Macau a 30 de Junho seguinte. Criado Cardeal a 26-8-1707, recebeu o barrete a 6-1-1710, falecendo aqui a 8-6-1710, festa do Pentecostes. A 17-12-1706, o Imperador Kanghi obrigou todos os missionários, que quisessem ficar na China, a obter o píao ou diploma régio da permissão dos Ritos. Os que o não obtiveram foram expulsos para Macau, ficando esta cidade repleta de missionários.
Data da primeira vinda de Tournon a Macau
Quase todos os historiadores portugueses têm dado a data errada de 4 de Abril de 1705.
A Collecção de vários factos diz: «12 de Abril de 1705 -Consta que neste dia chegou o Patriarcha, de Antioquia Delegado Apostólico de S. Santidade vindo por Manila a esta Cidade a onde não quis desembarcar. No dia 4 deste mez desembarcou para a Ilha Verde, que era dos Padres da Companhia, e no dia 5 se partio para Cantão tendo antes sido vezitado pelo Sr. Bispo D. João do Cazal, o Governador, 107 os Superiores das Religiões 108 e os principaes moradores desta Cidade».
Marques Pereira, nas suas Efemérides, diz:
4 de Abril de 1705 - «Chega ao porto de Macau o patriarcha de Antiochia, Carlos Thomaz Maillard de Tournon, commisario e visitador apostolico, com poderes de «ligado a latere», enviado pelo pontifice Clemente XI para acabar com as controversias que então se davam na China entre os jesuitas e os missionarios das demais ordens sobre as ceremonias chinesas, e especialmente sobre as seguintes três pontos: 1 .º Se a voz tien, conforme a doutrina dos melhores lettrados chinas, e sentir do imperador e do imperio, siggnificava o Deus vivo e verdadeiro, criador de todas as cousas 2.º Se a veneração e culto, que os chinas dão a Confucio, seu grande mestre, e aos progenitores defunctos, significado pela voz e lettra Ci, era meramente politico e licito. 3.º Se eram licitas as tabellas, em que os chinas, para memoria e veneração dos seus progenitores defunctos, têem escriptos os nomes délles. - Foi busca-ló (ao patriarcha) ao navio, em que vinha, o padre Francisco Pinto, da Companhia de Jesus, provincial do Japão e reitor de collegio de Macau, com outros padres seus subditos, e no mesmo dia o hospedou na quinta que o mesmo collegio tem em uma pequena ilha dentro do porto, e que chamam Ilha Verde. Ahi foram no mesmo dia vista-ló o bispo e o capitão geral de Macau, e lhe fizeram singulares obsequios e offerecimentos. Não quiz porem o patriarcha deter-se, mas logo no dia seguinte se partiu para a cidade de Cantão, metropole da provincia deste nome, e chegou a ella aos 8 do mesmo Abril».
Bento da França nos "Subsidios", Levy Gomes no "Esboço" e Luís Gonzaga Gomes nas suas "Efemérides" repetem o mesmo. O P. Videira Pires escreve: «No dia 4 de Abril de 1705, chega de Manila a Macau, no barco Sm. Juan do capitão arménio Ignácio Marcos, o Legado Pontifício, Charles Thomas Maillard de Tournon, que vem perturbar a vida religiosa e política da Cidade do Nome de Deus e das Missões Católicas na China. Em atenção ao Legado, perdoaram-se a Marcos os direitos do cabedal próprio, cobrando-se-lhe apenas 2% (para a Sta. Casa e as Clarissas), mas tendo de desembolsar os direitos ordinários das fazendas dos consignatários...
Aos 8 de Junho de 1710, falece, no convento de S. Agostinho, possivelmente duma úlcera no duodeno, o referido Legado «a latere» do Papa, cujo cadáver se traslada solenemente para a Catedral, no dia 27 de Fevereiro de 1719». E em nota acrescenta o P. Videira: «Aos 8 de Dezembro de 1712, os Padres Ortiz, Nuñez, e Barruelo, O. S. A., embarcaram para Manila, num navio português. O capitão-geral de Macau obrigou também a embarcar, nesse navio, o P.e Gabriel di S. Giovanni, O. F. M., da observância, italiano»
Chegada de Tournon
Já em 1940 havíamos afirmado em Macau e a sua Diocese, II, 179, acerca de Tournon: «Chegou a Macau a 2 de Abril de 1705... o patriarca não quis entrar na cidade do Rei de Portugal e só aos 4 de Abril desembarcou na Ilha Verde». (na imagem)

Um documento de 1712 afirma claramente. «Luego que el Exm.º Senhor Patriarcha Antiocheno Legado apostolico llegó a Macao a dos de Abril de 1705, no quizo dezembarcar-se para la Ciudade, solo alós 4 de Abril se dezembarcó para uma Islita de los R. R. P.es de la Comp.ª de Jesus dentro del puerto, y desde ally sim entrar en la Ciudade, luego el dia seguiente se partio para Canton, Ciudad del Imperio de la China» .
O conselho de evitar Macau fora-lhe dado por D. Frei João Francisco Nicolai, O.F.M., inimigo acérrimo do Padroado Português. Dizia ele numa carta a Tournon, datada de 23-2-1702: «Deve advertir-se que os missionários que não passam por Portugal, ou por Goa, têm de evitar o ingresso em Macau para não incorrerem em várias dificuldades»
Morte de Tournon
Não morreu duma úlcera no duodeno, mas de apoplexia, não no Convento de S. Agostinho, mas na casa onde vivia com seus criados e padres, segundo a carta de D. Bernardino della Chiesa a Clemente XI, de 4-9-1710: «Há poucos dias, com meu grandíssimo desgosto, chegou-me de Macau a funesta notícia da morte de S. Eminência o Snr. D. Carlos Tom. de Tournon, criado Cardeal da S. Igreja por V. S., a qual ocorreu na dita cidade (Macau) aos 8 dias de Junho do presente ano, dia santo de Pentecostes, depois de estar muito tempo doente, sendo a sua enfermidade agravada talvez por vários sofrimentos e desgostos. Na manhã desse dia comungou por viático e, a seguir, reclinou-se no leito; poucas horas depois, foi assaltado de apoplexia e munido com a Extrema-Unção, e entregou a alma ao Senhor entre as mãos dos seus familiares e dos missionários ainda ali residentes».
A 4-7-1711, Della Chiesa escrevia aos Cardeais: «Participo em primeiro lugar a morte de S. Ex.ª o Snr. Card, de Tournon, ocorrida em Macau no dia de Pestecoste depois de estar muito tempo doente; atacado de apoplexia, confortado com os SS. Sacramentos, entregou a alma ao Senhor».
A D. João Francisco Nicolai, O. F. M. escreveu Della Chiesa a 17-10-1712:
«S. Ex.ª já morreu de improviso, não tendo deixado sucessor. Faleceu na casa onde vivia, perto da Fortaleza da Barra, sendo o seu corpo metido num caixão para depois ser levado para Roma». Frei José de Jesus Maria diz: «foi Deos servido dar lhe huma doença, em que levou a sua Alma desta para a melhor vida, e se lhe fez nesta terra hum funeral sumptuozo, com toda a possivel pompa, dando se a seu corpo sepultura nesta catedral».
A Collecção de varios factos dá a data errada de 8 de Julho em vez de 8 de Junho, dizendo: «8 de Julho de 1710 - «Neste dia pela huma da tarde falleceo o Sr. Patriarcha D. Carlos Thomas já este tempo feito Cardeal -logo se soube da sua morte dobrarão os sinos.»
Texto da autoria de Monsenhor Manuel Teixeira

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