sábado, 28 de junho de 2014

A 'revolução' dos hydrofoil

Nos primeiros anos da década de 1960 Harry Redl visitou Macau e fotografou-o de uma forma exemplar deixando o registo dessa passagem num livro em 1963. A viagem que fez até ao território a partir de Hong Kong foi a bordo de um ferry. “É possível partir de Hong Kong à tarde através dos barcos de carreira, chegar a Macau ao entardecer, fazer uma rápido tour no crepúsculo, jantar, jogar no casino e voltar de barco (com cabine para dormir) depois da meia noite, a tempo de chegar a Hong Kong na madrugada", escreveu acrescentando que Macau merecia mais do que uma visita rápida e superficial. No regresso a Hong Kong Harry faria a viagem de forma muito mais rápida. De hidroavião em pouco mais de 15 minutos. Mas os tempos das ligações lentas (cerca de 4 horas) por via marítima estavam a acabar.

Na edição de 28 de Setembro de 1963 o "Notícias de Macau" informa que "O senhor Teddy Yip, sócio-director da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L, após uma visita aos Estados Unidos da América, segui para Itália onde visitou as oficinas navais de Messina, na Sicília, onde encomendou para a S.T.D.M., o primeiro hidroplanador, para as novas carreiras rápidas, cómodas e confortáveis, entre Macau e Hong-Kong, que aquela companhia concessionária tenciona estabelecer a partir de Janeiro de 1964. O hidroplanador encomendado, deverá chegar a Macau no fim deste ano (1963). Tem a marca de P.T. 20, 20, 7 metros de comprimento e lotação para 72 passageiros, podendo cobrir normalmente a distância de 35 milhas por hora e, atingindo 45 milhas a sua velocidade máxima."
A 18 de Fevereiro de 1964 chegava a tão esperada notícia. "Procedente de Messina, Itália, chegou, anteontem, a Hong-Kong, o primeiro hidroplanador, adquirido pela Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (S.A.R.L.) para as carreiras entre Macau e o vizinho porto britânico. Este hidroplanador, que recebeu o nome de "Coloane", tem as seguintes características: comprimento - 69; máquinas com 1 330 H.P.; velocidade - 32,4 nós. Dispõe de 65 lugares (assentos almofadados, semelhantes aos dos aviões). Após umas viagens experimentais, fará brevemente as anunciadas carreiras, entre os dois portos vizinhos, sendo a viagem de uma hora apenas. Carreiras rápidas, confortáveis e acessíveis, pois que as passagens custarão apenas $15 e $20 patacas."
A 29 de Fevereiro o "Notícias de Macau" fazia o ponto de situação. "O hidroplanador "Coloane", recentemente chegado a Hong-Kong, procedente de Messina, Itália, já fez duas viagens experimentais no vizinho porto britânico. Esta moderna unidade, adquirida pela "Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, "S.A.R.L" , como se sabe, destina-se às carreiras entre os portos vizinhos e será explorada pela Companhia de Navegação "Son Tak", de que é proprietário o sr. Henry Fock, um dos sócios-directores da "S.T.D.M".
Espera-se que inicie as anunciadas viagens nos princípios do próximo mês de Março (1964). Para a sua atracação, utilizar-se-á a nova ponte, em construção, no Porto Exterior,
cuja obra está sendo adaptada para esse fim."
A primeira viagem efectuou-se a 16 de Março de 1964 e a partir de então o quotidiano em Macau alterava-se. Primeiro foi contrato de concessão do jogo assinado entre o governo e a STDM e agora eram as ligações rápidas que iriam trazer mais forasteiros a uma cidade até ali muito pacata. Aliás, os dois assuntos estão interligados. O jogo só fazia sentido com jogadores e esses, nesse início da década de 1960, vinham de Hong Kong.
Os hydrofoil vieram revolucionar as ligações marítimas entre Macau e Hong Kong e, por via disso, a ligação do território com o mundo exterior. Começaram a operar em 1964 ainda o terminal do Porto Exterior (que começou por ser de madeira) não estava prontos. As embarcações atracavam num batelão colocado naquela zona.
Anúncio no "Notícias de Macau"

Já no final da década duas empresas asseguravam as ligações diariamente. Uma delas, a Hong Kong Macao Hydrofoil Co., fazia 17 viagens diárias com o Flying Albatross, Flying Skimmer, Flying Kingfisher, Flying Phoenix, Flying Swift e Flying Heron. A outra empresa assegurava apenas oito ligações com as embarcações Guia, Penha e Coloane, embora este último tivesse um estatuto diferente. Ficava normalmente em standby e reforça o serviço aos fins de semana. Havia partidas (de Macau e de Hong Kong) a cada hora e meia. No Verão operava entre as 7h45 e as 18h30. Os bilhetes variavam entre as 10 patacas (dias úteis) e as 20 patacas (fim de semana e feriados).


António Cambeta, era agente da Polícia Marítima e Fiscal, tendo feito serviço nessa condição na ponte-cais do Porto Exterior. "Esta ponte cais era constituída por dois batelões, que tinham dois cais de atracação, uma sala com bar, um pequeno espaço no corredor onde se encontravam instalados os Serviços de Migração, um corredor, em madeira, que vinha dar para a Avenida, e quase na saída existia um espaço, que tinha um pequeno quarto, e tinha um balcão, usado pelo agente da Polícia Marítima e Fiscal, para verificação de bagagens. Na parte de fora, encontrava-se a bilheteira da companhia.Era ponte pequena, sem condições, onde os passageiros não tinham comodidades algumas, pois não havia salas de espera, com assentos, era a sala, rectangular, onde existia um bar, que os passageiros aguardavam a sua vez de embarcar.

Ao agente da PMF, competia assegurar a boa ordem do cais, assistir ao embarque de passageiros, contando correctamente o seu número, se, por lapso ou descuido na contagem, embarca-se um passageiro a mais o hidroplanador, depois de largar, regressaria ao porto de Macau, afim de desembarcar o passageiro, originando uma perda de tempo e sendo punido, disciplinarmente o agente da PMF. Era um pontão que dava imenso trabalho e dores de cabeça, não só aos funcionários da companhia, mas igualmente ao agente da PMF e PSP (Serviços de Migração) ali em serviço."
Anúncio de 1966
Só por curiosidade, refira-se que no filme da saga de James Bom, "O Homem da Pistola Dourada" (1974), o protagonista viaja no hidroplanador “Flying Sandpiper”, da Hong Kong Macau Hydrofoil Co. Ltd. Importa ainda referir que não obstante o aumento da oferta tendo como grande atractivo a rapidez, os 'velhinhos' ferrys que atracavam no Porto Interior continuaram operacionais até ao início da década de 1980, sendo mesmo os preferidos de muita das gentes de Macau. Os que não tinham pressa e os que não tinham muito dinheiro. Desses tempos ficam na memória nomes como Fat Shan, Tak Shing, Tai Loy, Tung Shan, entre outros.
Artigo da autoria de JB publicado no JTM 19.6.2014

sexta-feira, 27 de junho de 2014

"Macau" por Daniel Carney (1944-1987)


Daniel Carney (1944–1987) escreveu diversos romances. Três foram adaptados ao cinema: The Whispering Death, The Wild Geese (Gansos Selvagens) e Return of the Wild Geese. Em 1985 publicou "Macau", um romance que gira em torno do tráfico de ouro entre Macau e Hong Kong.
Filho de um diplomata britânico, Daniel Carney nasceu em Beirute. Viveu a infância e parte da juventude entre o Extremo-Oriente e Inglaterra. Acabou por se estabelecer na Rodésia em 1963. Trabalhou ainda na polícia da África do Sul durante 3 anos e meio retirando-se para se dedicar ao mercado imobiliário e à escrita. Morreu em 1987 com apenas 42 anos.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Padre Tomás Pereira (1645-1708)

Busto na terra natal
Tomás Pereira (1645-1708) foi missionário na China e desempenhou um importante papel para o estabelecimento do primeiro acordo de fronteiras russo-chinês. O documento em questão, que ficou conhecido como Tratado de Nerchinsk, foi celebrado no final do Século XVII e teve a participação também de outro padre missionário, o francês J.F. Gerbillon.
Tomás Pereira é um dos europeus mais importantes na China de Kangxi, exercendo junto e para o Imperador da China, Qing, funções de professor de música, conselheiro diplomático, tradutor-intérprete para e da língua chinesa, matemático astrónomo, arquitecto e geógrafo, criador de grandes relógios e órgãos mecânicos, consultor político e missionário jesuíta
Deixou uma vasta obra que uma equipa do CCCM reuniu em 2011 em vários volumes. O primeiro reúne 11 documentos biográficos e 151 cartas de Tomás Pereira, tendo ficado no segundo dez documentos da sua autoria, incluindo um que apresentara ao imperador, em conjunto com Antoine Thomas, em 1692, e o “Tratado do Budismo Sínico”. A obra de Tomás Pereira/Xu Risheng ficou manuscrita em português e latim tendo, por isso, uma circulação restrita e controlada. Em língua chinesa, no entanto, surge impressa logo nos inícios do século XVIII.
Imperador Kangxi
Em 25 de Setembro de 1663 entrou para a Companhia de Jesus. Em 15 de Abril de 1666 embarcou para a Índia, continuando os seus estudos em Goa, chegando a Macau em 1672. Tomás Pereira viveu na China até à sua morte em 1708. Foi apresentado ao imperador Kangxi pelo colega jesuíta Ferdinand Verbiest. Foi astrónomo, geógrafo e principalmente músico, sendo autor de um tratado sobre a música europeia que foi traduzido para Chinês, e também construtor de um órgão e de um carrilhão que foram instalados numa igreja de Pequim. É considerado o introdutor da música europeia na China.
Foi responsável pela criação dos nomes chineses para os termos técnicos musicais do Ocidente, muitos dos quais usados ainda hoje. Concluiu ainda um tratado sobre budismo chinês e o primeiro tratado de musica ocidental (também convertido para chinês), e foi o responsável pelo Calendário Astronómico, instrumento indispensável na vida política chinesa daquele tempo – nele eram determinadas as datas das cerimónias religiosas que o imperador, como representante do reino do Céu, tinha que presidir. Essa confiança do soberano chinês culminou com a publicação do Édito de Tolerância de 22 de Março de 1692 permitindo a difusão e prática do Cristianismo na China.
Demonstrou, com este gesto, o Imperador Kangxi, uma invulgar abertura ao Ocidente da qual resultou, não apenas o florescimento da Missão Católica e a confirmação da respeitabilidade do saber ocidental na China, como assegurou a frágil situação de Macau, o único entreposto europeu no Império. Kangxi,foi  um dos mais importantes imperadores da última dinastia e que governou a China durante 61 anos, até 1722, considerava Tomás Pereira "um companheiro exímio" e "sempre leal" tendo-o nomeado mandarim, com um estatuto equiparado a vice-ministro. Natural de Vale S. Martinho, concelho de Vila Nova de Famalicão, em Macau o seu nome ficou imortalizado numa avenida e numa rotunda da Ilha da Taipa.
Sugestão de leitura: O diário do Padre Tomás Pereira, S.J.: os jesuítas e o Tratado Sin-Russo de Nerchinsk (1689). Edição ICM, 1999.
O livro de Sebbes, norte-americano também ele jesuíta, foi escrito em 1961.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Souvenir de Macau: 1921

Continuando a evocar o Dia de Macau - 24 de Junho - escolhi para hoje este pequeno livro (24 páginas) intitulado "Souvenir de Macau". Edição de 1921 com 24 fotos de Macau no início do século XX feitas por J. Arnold e com edição de Hood & Co. Ltd Engravers and Printers. Middlesbrough, England. Apesar da empresa estar registada em Inglaterra é de admitir que tivesse uma sucursal em Hong Kong e que a impressão fosse feita na então colónia britânica
Esta edição muito provavelmente era oferecida ou vendida nos barcos a vapor que faziam a ligação entre Macau - Hong Kong - Cantão. Já encontrei capas com várias cores. As fotografias são a preto e branco.
Entre as fotografias podemos ver (reproduzindo as legendas originais): palácio das repartições, praia grande, palácio do governo, farol da guia, avenida vasco da gama, rua do campo, hospital militar, templo chinez, estrada da bella vista, rua de s. lourenço, porto interior, etc. Algumas das legendas estão erradas.


 
 Estrada da Bella Vista

 Villa Leitão

terça-feira, 24 de junho de 2014

24 Junho 1940: inauguração estátua Ferreira do Amaral



Imagens acima são da década 1950. Cedidas por Carlos A. Dias
24 de Junho 1940: dia de Macau assinalado com pompa e circunstância, nomeadamente com a inauguração da estátua do antigo governador de Macau, Ferreira do Amaral, (enviada para Portugal em 1992).


segunda-feira, 23 de junho de 2014

Monumento da Vitória sobre os holandeses em 1622

 O mesmo monumento (da Vitória) em dois momentos e locais distintos. 
Ainda se vê (em cima) o local de acesso a uma mina/fonte de água.
O Monumento da Vitória evoca a vitória sobre os holandeses em 1622. O
Nesta imagem existia um poço nas traseiras. O monumento foi mudado de lugar.

domingo, 22 de junho de 2014

Cinema Lido: 22 Junho 1968 - 19 Maio 1995

Inauguração a 22 Junho 1968
Foto de AJMN Silva
Um bilhete de Janeiro de 1972

No final da década de 1960 Macau tinha certamente o maio número de salas de cinema por metro quadrado e também o maior número de espectadores: Lido (1256 lugares) Alegria (1160); Apollo (1038); Capitol (869); Alegria/Cidade de Ouro (835); Cheng Peng (1342); Império (906); Lai Seng (824); Nam Van (1603); Oriental (1020); Roxy (1005); Vitória (834) e na ilha da Taipa , o “Taipa” (760 lugares). Ir ao cinema era um hábito bastante enraízado na sociedade macaense.


Localizado no cruzamento da avenida Almirante Lacerda com a avenida Coronel Mesquita, o cine-teatro "Lido" funcionou entre 1968 e 1995. O edifício seria demolido já na primeira década do século XXI.


sábado, 21 de junho de 2014

Uma imagem com 40 anos...

Finais de 1974:
Liceu, hotel Lisboa, ponte Nobre de Carvalho e estátua de Ferreira do Amaral

sexta-feira, 20 de junho de 2014

"Os Azuis Macaenses"

O Grupo Desportivo “Os Azuis Macaenses” organizado por José Ernesto de Carvalho e Rego (filho) e apoiado pelo Pe. Ramiro dos Anjos Marta, foi formado em 1956, e a rapaziada de Macau brilhou nessa época em futebol em miniatura e natação.
Foto de 1957
A equipa de “bolinha”, constituída na maioria por estudantes que participaram no Primeiro Campeonato Escolar de Futebol de Macau, fez frente ao Negro Rubro, Melco, Lin Yee, Lo Leung, equipa da PSP, Sporting, e a formação militar BC2 (considerados os melhores grupos de bolinha desse tempo) obtendo excelentes resultados.
Pelos Azuis alinhavam Onofre Dias e Armando Ferreira(guarda-redes), Rui Aires da Silva, Santão, Filipe Sanchez, António Serro, Rufino Mota e Chichi Fernandes e o seu futebol era tão bem jogado que quando jogava a equipa dos “Azuis” o campo enchia-se de espectadores tanto portugueses como chineses. Nessa altura, a época da “Bolinha” começava em Junho e terminava em Outubro. Os jogos do campeonato eram disputados no Campo da Praia Grande onde se encontra hoje a Escola Portuguesa.
Havia dois desafios, diariamente. O primeiro com início às 18 horas e segundo logo a seguir às 19 horas. Não havia encontros do campeonato aos sábados e Domingos. Estes dias eram reservados para grupos de Hong Kong que vinham fazer jogos amigáveis.
Tal como apareceu em grande forma, rapidamente o clube se desfez, o que foi muito lamentado nos círculos locais. A verdade é que a bolinha era apenas um “hobby” e cada um dos jovens tinha a sua vida para seguir. Por isso o famoso grupo de bolinha, composto por jovens macaenses desapareceu em pouco tempo.
Onofre Dias ingressou na Polícia de Segurança Pública, onde fez a sua carreira até que mais tarde veio a falecer em Macau. Armando Ferreira foi trabalhar para o “Hong Kong Bank” e reside, actualmente, em Los Angeles. Rui Aires da Silva que fez parte da selecção de Hóquei de Hong Kong nos Jogos Olímpicos, realizados em Tóquio vive hoje em Vancouver. Santão vive em Toronto, onde fez a sua carreira profissional. Filipe Sanchez voltou para México. António Serro mora entre Toronto e em Portugal. Rufino Mota seguiu para Moçambique. Chichi Fernandes foi trabalhar para Hong Kong, onde viria a falecer

A natação, por outro lado, era muito popular em Macau nos anos cinquenta. No mesmo ano de 1956, Sporting e o Benfica organizaram um torneio de natação, reservado à participação de nadadores portugueses na piscina municipal do Estoril que foi inaugurada em 1952 pelo ministro do Ultramar Sarmento Rodrigues, sendo então Governador de Macau o almirante Joaquim Marques Esparteiro.Participaram nas provas de natação o Sporting, Benfica, os Azuis Macaenses e marinheiros do Aviso João de Lisboa ou do Gonçalo Zarco.
A classificação final ficou assim ordenada: 1º Os Azuis Macaenses 2º Sporting 3º Benfica 4º Marinha. 
Quanto aos resultados das provas: Nos 50 metros livres teve como vencedor Rogério Manhão, dos Azuis, seguido de Sebastião Azedo, também dos Azuis. Nos 100 metros livres verificou-se o mesmo resultado. Venceu Rogério Manhão, dos Azuis, seguido de Sebastião Azedo, também dos Azuis. Nos 50 metros costas, o primeiro lugar foi para um atleta do Sporting, seguido de Armando Ferreira, dos Azuis.Nos 100 metros costas houve resultado semelhante: o primeiro lugar foi para um atleta do Sporting, seguido de Armando Ferreira, dos Azuis. Nos 200 metros livres, os dois lugares cimeiros foram para atletas dos Azuis, primeiro José Martins e Eduardo Rosa em segundo lugar. Na Estafeta 4x100 a vitória foi para a equipa dos Azuis, constituída pelos atletas Rogério Manhão, Sebastião Azedo, José Martins e Eduardo Rosa. Em segundo lugar ficou o Sporting e em terceiro o Benfica.Nos 100 metros bruços, venceu um atleta do Sporting seguido de Xavier dos Azuis e um atleta do Benfica em terceiro lugar.
Foi realmente uma noite de grande triunfo para os nadadores locais, e para a efémera equipa de “Os Azuis Macaenses”.
Artigo da autoria de Henrique Manhão publicado no Jornal Tribuna de Macau a 21-05-2009

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Sir Robert Ho Tung: Junho de 1933



Numa nota sobre a assistência social em Macau encontrada num artigo sem data e sem autor pode ler-se: "1941-1945. Macau tornou-se um asilo de refugiados, morrendo de inanição 100 por dia. Além de mais de 100 000 chineses, vieram uns 8 000 portugueses de Hong Kong e a todos se procurou ajudar. Até o multimilionário, Sir Robert Ho Tung, aqui se acolheu, sendo-lhe fornecidas latas de leite para seu sustento, pois a comida escasseava.”
Depois de morrer este filantropo deixou ao governo de Macau a sua casa (hoje é uma biblioteca - ver última imagem), 50 mil patacas para a caridade e já antes doara igual valor para a construção de uma escola que se veio a chamar Escola Luso-Chinesa Sir Robert Ho Tung.
A fotografia é de 12 de Junho de 1933 e mostra Sir Robert Ho Tung e a filha à saída da Conferência Económica Mundial realizada em Junho desse ano no hotel Claridge de Londres. Na altura procuravam-se saídas para a crise provocada pela Grande Depressão de 1929.
Informações adicionais sobre Sir Robert Ho Tung (imagem acima da sua casa) neste link:

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Lápides junto à Gruta de Camões (贾梅士岩洞)



As primeiras lápides de evocação do poeta Camões junto à sua gruta e  busto são feitas de granito. Colocadas ao longo de diferentes anos têm gravados textos das mais diversas personalidades: duas quadras de Francisco Maria Bordalo (1851); uma oitava, em espanhol, de Heriberto Garcias de Quevedo (1869); um Soneto em italiano dedicado a Vasco da Gama, de Torquato Tasso; Sonnet to Macao, de Sir John Bowring (1840); In Cavernan, ubi Camões, cinco quadras em latim da autoria de John F. Davis, governador de Hong Kong (1831) e uma estrofe do Canto Quinto do poema Camões, de Almeida Garrett. Esta compilação foi ainda enriquecida com dois outros tributos em mármore, colocados a 10 de Junho de 1932 e que correspondem à versão portuguesa e chinesa de um texto dedicado ao “Príncipe dos poetas portugueses”, pelo grupo de escuteiros portugueses nº12 e pela escola chinesa Yuet Wah.

Yo poeta tambien, tambien soldado,
Si bien no por la fama enaltecido ;
Tambien de hondas passiones arrastrado
Tambien de hados adversos combalidos
En el altar a tu estro consagrado
Menos angusto a fe que merecido
Suspendo de mi amor esta memoria
Tribute exigno de tan alta gloria.


Don Huiberto Garcia de Luenedo. 1869

 Yasco le cui folici ardito antenno
In coutre al Sol che ue ripartaft giorus.
Spiegaric voie o ter cola ritorno
Dove ogli var che ai caderoacconuay

Non piu di to asuero near sostenrio
Quel che fece al leictope chraggo et sconno.
No che un bo 1'aygie noi suo sorggiorne
Ne die piu vel subertro a coltro penue

Et hor quelta est calti et tuon Luigi
Lantte altro stoude al glorioso velo
Che i tuoi spaluiati logai auliar meu lungo

Ouda quela a qui statzu il nostro Polo
Et achi foruea incontra suoi vessigi
Per lui del corso tue la funa agginogo

Torgunto Tasso

Sonnet to Macao

Gem of the orient earth and open sea
Macao that in thy lap and on thy breast
Hast gathered beauties all the lovliest
When the sun smiles in his majesty

The very clouds that top each mountain crest
Seem to repose there, lingering lovingly
How full of grace the green cathayou tree
Bends to the breeze and now thy sands are prest

With gentle waves which ever and anon
Break their awakened furies on the shore
Were these the scenes that poet looked upon
Whose lyre though known to fame knew misery more

They have their glories and earth's diadems
Have naught so bright as genius gilded gems

Macao 30th July 1849





Oh gruta de Macáo soidão querida
Onde tao doces horas de tristeza
Do saudado passei! gruta benigna
Que escutaste meus languidos suspiros;
Que ouviste minhas queixas namoradas,
Oh fresquidão amena, oh grato asylo
Onde me ia acoitar de acerbas mágoas
Onde amor, onde a patria me inspiraram
Os maviosos sons e os sons terríveis
Que hao de affrontar os tempos e a injustiça!
Tu guardarás no seio os meus queixumes,
Que contarás ás provindouras eras.
Os segredos d´amor que me escutaste,
E tu dirás a ingratos Portuguezes
Se portuguez eu fui, se amei a patria
Se alem d´ella e d´amor, por outro objecto
Meu coraçao bateu, lutou meu braço
On modulou meu verso eternos carmes

Visconde D' Almeida Garrett

Noutra parte da gruta encontramos, outros versos, como este escrito em latim, em 1831, por Sir John Davis, governador de Hong Kon.

In cavernam ubi Camoens

Opus egregnim composuisse fertur.
Hie, in remotis sol ubi rupibus
Fronnes per alias mollius incidit,
Fervebnt in pulchram camoenam
Ingenium Camooentis ardens

Signnm poetse marmore lucido
Spirabat olim, carminibus sacrum,
Parvumque, quod vivens amavit,
Effigie decorabat antrum ;

Sed jam vetustas, aut manus impia
Prostravit, eheu! Triste silentium
Regnare nunc solum videtur
Per scopulos, virides et umbras !

At fama nobis restat at inclytum,
Restat poetae nomen at ingeni
Stat carmen exemplum perene,
^:rea nee monumenta quaerit,

Sic usque Virtus vincit, ad ultimos
Perducta fines temporis, exitus,
Redens sepulchrorum inaues,
Mamoris et celerem ruinam

terça-feira, 17 de junho de 2014

O Conde Benyowsky

Em 1996, numa edição do CIT, o padre Manuel Teixeira escreveu "O Conde Benyowsky em Macau" e aqui pelo blog já dei conta de um artigo de José Simões Morais sobre o tema (publicado inicialmente no JTM). O que proponha desta vez é um pequeno texto de Marques Pereira publicado no Ta-ssi-yang-kuo (série II - Volume II, em 1902). Boa leitura!
"Quem era este conde Benyowsky? Temos poucos dados a seu respeito, principalmente sobre a sua estada em Macau; mas conseguimos ainda assim apurar o seguinte:
Maurício Augusto, conde de Benyowsky ou Beniowski, nasceu em 1741 em Verbova, na Hungria, mas era de origem polaca. Serviu primeiramente como tenente no exercito austriaco, em que seu pae era general; depois de ter viajado na Europa, tornou-se, em 1768, n'um dos chefes da confederação do Bar, na Polónia, contra a Rússia, que o aprisionou em Cracóvia e o mandou desterrado, primeiro para Kasan e depois para Kamchatka. Ahi obteve as boas graças do governador Niloff, cuja filha mais velha se apaixonou por elle. O amor da pobre russa (com quem, segundo alguns, casou), abriu-lhe as portas da prisão em 1771, e com 76 companheiros e com sua amante ou esposa, fugiu para Macau. Quanto tempo se demoraria em Macau?
Morreria a infeliz Niloff', depois d'elle se ter ausentado da nossa colónia.'' Ou foi só depois da morte da amante que elle se lançou em novas aventuras, no termo das quaes havia de encontrar a morte ? Não possuo os dois volumes das suas Viagens e Memorias, onde talvez se encontre alguma indicação a este respeito (*).
Julien Mauvrac, na Conqiiête de Madagáscar, refere-se a Benyowsky nos seguintes termos: «A nossa colónia de Madagáscar vegetava, no reinado de Luiz XV, d'um modo bem precário, quando appareceu o famoso Benyowsky. «Mauricio Benyowsky, conde polaco, que os russos tinham internado (*) Publicadas em francez, em Paris, em 1791. Feller, a respeito d'essa obra, diz o seguinte :
"Les Voyages et Mémoires, publiées sous son nom, Paris en 1791, 2 vol. in-8.", ne sont à beaucoup d'égards qu'un roman, ou il est difficile de distinguer les faits réels de ce qui est purement le fruit de imagination." Terá razão Feller. Mas haverá coisa mais romântica que a vida d'esse homem extraordinário em Kamtchatka, teve uma existência que dependeu mais do romance que da vida real.
«Tendo casado (*) com a filha do director da cidadella em que estava preso, conseguiu fugir com ella até Macau, colónia portugueza, nos mares da China ; foi ahi recolhido por um navio francez que se dirigia para Fort-Dauphin. Madagáscar enthusiasmou o. Foi a Paris, interessou os ministros nos seus planos e recebeu todos os poderes necessários e o commando d' uma pequena tropa. No fim de três annos, em 1776, graças a uma politica hábil com os indigenas, foi o conde polaco proclamado rei; mas excitou a desconfiança dos nossos agentes e o ciúme dos nossos oííiciaes, que se sentiam oftuscados com a sua qualidade de estrangeiro. Veio a Paris, com um tratado de alliança; mas, nada conseguindo, devido a esses inimigos que creára e que difficultavam os seus projectos, sahiu de França. Retirou-se para os Estados Unidos, onde recrutou partidários, e em 1785 tornou a apparecer no seu reino. Agora, que já não combatia por ella, a França não podia tolerar este rei polaco e a sua guarnição n'uma ilha considerada como colónia franceza. Um navio francez canhoneou-os no forte em que estes aventureiros se tinham refugiado, e Benyowsky foi morto por uma bala. Assim acabou este heroe de romance.»
E assim terminou a aventurosa vida o amante da pobre abandonada, que em Macau tanto o chorou quinze annos antes, e cuja sepultura, na egreja de S. Paulo, sessenta annos depois, havia de excitar a commoção do escriptor sueco, cujo trecho transcrevemos e que certamente foi escripto antes do incêndio de S. Paulo em 26 de Janeiro de 1835.
(*) Grégoire, no seu Diccionario encyclopedico de historia, de biographia, etc, não diz que a filha de Nillofí fosse mulher do aventureiro, quando este fugiu de Kamtchatka: «II gagna la faveur du gouverneur Niloff, et parvint à fuir, en liii enlevant sa filie..» Mas na obra Madagascarn, publicada em 1889, por ordem do sub-secretario das colónias, de França, vem o seguinte: «Au Kamchatka, le gouverneur le pria de donner des leçons de français à ses filies ; Tainée s'éprit bientôt de lui L'ayant obtenue en mariage, il fut à même de mener à bien de projet d'évasion qu'il avait forme dès de prémier jour.»
D'onde se vê que o desespero da infeliz menina foi provavelmente motivado pela circumstancia de se ver casada com um homem já casado. Pela mesma obra se vê que Benyowsky, antes de chegar a Madagáscar, estivera na ilha Formosa, onde chegara a persuadir os chefes indigenas da conveniência da colonisação europea e chegou a fazer tentativas para esse fim, quando depois esteve em França. Foi depois da sua estada na ilha Formosa que chegou a Macau. Estes e outros episódios da movimentada vida de Benyowsky, serão por nós devidamente desenvolvidos quando tratarmos, em secção especial d'esta revista, dos diversos estrangeiros celebres que residiram em Macau."
Pintura ca. 1830. (vista península: portos interior e exterior) autor desconhecido
J. F. Marques Pereira surge assim referido nesta edição de 1902.
Official, chefe de secção, do Ministério da Marinha e Ultramar; Official da Ordem de S. Thiago, do mérito scientifico, litterario e artistico;
Membro honorário da Real Sociedade Asiática Ingleza e titular da Sociedade Asiática de Paris; vogal da Commissão Asiática da Sociedade de Geographia de Lisboa;
Sócio effectivo da Sociedade de Geographia de Paris; vogal da Secção de Archeologia da Real Associação dos Architectos e Archeologos Portuguezes, e Sócio correspondente do Instituto Archeologico e Geographico de Pernambuco, etc.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

A viagem do "Pátria": mais alguns elementos

O avião Breguet Br.16-Bn2 (ou XVI-Bn2), era um bombardeiro nocturno derivado do XIV-A2, motor Renault de 300 CV, com asas de maior envergadura e carlinga simples para três tripulantes. O único modelo existente em Portugal foi adquirido por subscrição pública em Junho de 1921, promovida por Pinheiro Correia, Jardim da Costa e Levy Bensabat. Depois de comprado em França, deu entrada nos hangares da Amadora onde se iniciou a sua montagem, orientada por Manuel Gouveia e Joaquim de Sousa. Uma modificação importante foi introduzida: a instalação de depósitos suplementares de combustível, para aumentar o seu raio de acção. Ficou pronto em fins de Agosto tendo Brito Pais escolhido o nome «Pátria» e mandado inscrever na fuselagem o verso dos Lusiadas:«Esta é a ditosa PÁTRIA muito amada». Fez o primeiro voo em 22 de Setembro, como preparativo de uma viagem ao Brasil, que não se efectuou devido a danificação do avião, em Novembro, na sequência de um ciclone que fez abater o hangar onde se encontrava estacionado. A sua reparação só se iniciou em Junho 1922, devido a demora das peças vindas de França, quando já Gago Coutinho voava para o Brasil. Foi decidido então utilizar o «Pátria» numa ligação Lisboa-Macau, que se iniciou apenas em Abril de 1924, devido a várias dificuldades burocráticas e de falta de apoio.
Em 1924 o "Pátria" descolou da actual cidade da Amadora rumo a Vila Nova de Milfontes (Sul de Portugal – Alentejo). Ali chegados, a aeronave foi baptizada pelo bispo de Beja, D. José do Patrocínio Dias. Maria do Céu (a irmã de Brito Pais) quebrou no cubo da hélice a tradicional garrafa de champanhe. As palavras de Sarmento de Beires: "O pai tirou do dedo o anel brasonado da família e entregou-o ao filho que vai partir. No capitão Brito Pais, concentrava-se naquele instante a tradição impoluta de uma família inteira."
A 7 de Abril, partem decididos a estabelecer a ligação a Macau. Manuel Gouveia, viajaria de barco até Tunes, onde se juntaria à tripulação. A viagem começou mal, devido a um forte temporal. Indiferentes ao perigo, fazem descolar o "Pátria" em direcção a Tunes, mas o mau tempo obrigou-os a escalar Málaga e depois Oran: "As cordas zunem, as asas estalam, tudo range. Mãos crispadas nas alavancas de comando, sentimos o aparelho que se despenha, se furta debaixo de nós, que nos abandona no espaço, que parece ir despe­daçar-se em pleno voo. O pesadelo dura alguns segundos."
Embarcado Manuel Gouveia em Tunes, o voo decorre sem problemas de maior, passando por Tripoli, Homs, Bengazi e Cairo.
Viagem a Timor
Humberto Cruz (1900-1981), natural de Coimbra e detentor dos cursos de artilharia, de piloto aviador e de piloto de voo sem visibilidade exterior, serviu, a partir de 1927, em várias esquadrilhas da Força Aérea e chegou mesmo a comandar a base aérea de São Miguel. Entre 1930 e 1931, na companhia de outro aviador, Carlos Bleck, Humberto Cruz realizou, aos comandos do avião "Jorge Castilho", a primeira viagem aérea Lisboa-Guiné-Angola e regresso, numa distância de 20.160km. O percurso foi feito num total de 167 horas.
Humberto Cruz escreveu a propósito: "O glorioso navegador (Jorge Castilho) do Atlântico Sul, a quem a Pátria tanto deve; aquele que soube marcar no Grande Oceano a rota do 'Argos', o hidroavião que, pela primeira vez, navegou uma noite inteira ligando os dois continentes e duas pátrias, estabelecendo um recorde durável que nós não soubemos perpetuar na memória do mundo; o sábio aviador iria acompanhar-nos na nossa empresa", escreveu. Mas foi em 1934 que, juntamente com o primeiro-sargento mecânico da Aeronáutica Militar, António João Gonçalves Lobato (1909-1935), na avioneta Leopard Moth "Dilly" fez a viagem Lisboa­Timor-Lisboa. 
O baptismo do Pátria em v. N. de Mil Fontes
Este é um dos maiores feitos da aviação portuguesa e o facto de o avião ser relativamente frágil enobrece ainda mais a façanha. A 25 de Outubro de 1934, saíram da Amadora com destino a Timor, a bordo do "Dilly". No dia do regresso, a 21 de Dezembro de 1934, haviam percorrido 42.670km, voando 268 horas e 25 minutos.
O voo de ida atravessou a África do Norte, com paragens em Argel, Tripoli, Bengazi e Tobruk, o Médio Oriente, com passagem por Gaza e Basra, internando-se depois pelo actual Paquistão e Índia, com as etapas a terminarem em Jask, Karachi, Allhabad, para finalmente rumar ao Sudeste Asiático e às Índias Orientais Holandesas, passando por Akyab, Banguecoque, Prachuab, Singapura, Soerabaia, Rambang e Díli, onde foram recebidos com grande entusiasmo, a 7 de Novembro de 1934: "Os indígenas de Timor são mais dóceis e subordinados do que geralmente se acredita ( ... ) Não existia já um português em Timor, há tantos anos que a nossa força naquelas ilhas é nula, pois a força que existe é tirada deles mesmos", comenta.
Os aviadores saíram de Díli a 13 de Novembro e aterraram na actual cidade da Amadora (Portugal) a 21 de Dezembro, pouco antes do Natal, como desejara Humberto Cruz. Galardoado com a Torre e Espada, publicou diversas obras sobre aviação, tendo falecido a 10 de Junho de 1981. António Lobato foi escolhido como companheiro de viagem por Humberto Cruz, devido à sua competência, carácter alegre, correcção, aprumo e camaradagem. No ano seguinte ao da viagem, em 1935, morreu num desastre de avião perto de Viseu. "Morreu o Lobato!". A mensagem que ecoou, na sua simplicidade, transmitia a memória e o carinho colectivos que o País conservava de tão jovem e corajoso às da navegação aérea.


Em Milfontes pouco antes da partida do "Pátria" I