segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Conversa de Pacheco Jorge com Marcello Caetano (1946)

No espólio do Arquivo Salazar da torre do tombo está um documento que atesta a "Conversa entre o Ministro das Colónias, Prof. Marcello Caetano, e o Dr Américo Pacheco Jorge" a 21 de Fevereiro de 1946. Recorde-se que a guerra terminara meses antes e entre 1939 e 1945 Macau ficou sujeito a um bloqueio naval por parte dos japoneses sendo esta certamente a primeira viagem do advogado depois do fim do conflito.
O Dr. Pacheco Jorge, natural de Macau, onde advoga, saiu da Colónia em 24 de Dezembro, atravessou o Pacífico, demorou-se 21 dias nos Estados Unidos e chegou a Lisboa há uma semana. Na América fez conferências públicas sobre a China encontrando a mais viva curiosidade acerca dos assuntos chineses. Entre outras informações relativas à administração interna da Colónia, disse:
1. que em sua opinião a guerra civil na China se não reacenderá tudo indicando caminhar-se para a formação de um Estado Federal;
2. que em relação a Macau o Governo de Chun-King não mostra más disposições, mas que é Cantão quem decide com grande autonomia e em Cantão predominam os jovens universitários extremamente nacionalistas e, como tais, xenófobos;
3. que para êsses nacionalistas, a cessão de Macau a Portugal foi acto de um Ministro traidor, e constitui mancha da história chinesa que é preciso lavar;
4. que não reconhecem benefícios materiais resultantes do nosso domínio em Macau; também negam benefícios morais; e embora admitam vantagens da nossa acção protectora e benemerente em relação à população chinesa nos períodos conturbados, não a agradecem;
5. que assim a situação de Macau dependerá apenas da de Hong-Kong: mas esta, segundo todas as probabilidades, decidir-se-á pelo abandono da concessão por parte da Inglaterra, pacificamente negociado;
6. que a luta predominante hoje no sul da China é entre a influência inglesa e a influência americana: esta cresce de dia para dia, não só pelos poderosos meios de que se serve, como pelo grande número de intelectuais chineses educados na América e pelo facto de os americanos não terem adoptado qualquer sistema de separação racial, ao contrário dos ingleses;
7. que assim julga que os próximos cinco anos decidirão da sorte do nosso dominio em Macau, considerando portanto a situação eminentemente crítica.

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